O discurso eletrônico
Três são os grandes discursos de poder que pela sua influência e força social podem confundir o preceito de que discurso nada tem a ver com a ação: 1) no discurso político; 2) o discurso dos meios de comunicação; e o 3) o discurso da ciência e da tecnologia. O discurso da mídia procura convencer pela abrangência e penetração; o político pela sua abundancia e formalização e o da ciência e tecnologia pela sua forte promessa de verdade. Em geral o discurso, peça oratória ou escrito é um palavreado romanesco e espetaculoso, um enunciado querendo substituir uma atuação não acontecida.
O discurso político se referencia ao poder pela intenção de reconstrução ou modificação dos fatos sociais e econômicos em uma determinada ambiência. Quando transformado em ação o discurso político intervém em nossa relação com a realidade física que habitamos. O discurso dos meios de comunicação lida com a formação ou deformação da opinião pública para homogeneizar um maior público comum impingindo uma visão dos fatos e ideias que atendem a seus interesses. O discurso dos meios obedece a fatores e interferências externas voltadas para seus fins e mostrando ao público o cotidiano como espetáculo em um palavreado oco que quer moldar opiniões e não apregar para uma transformação social.
Como os outros, o discurso da ciência e tecnologia e inovação é só uma peça de informação. É um discurso de poder por conta da esperança que coloca para um melhor destino do homem. É, portanto, um discurso utópico quando contextualiza para possível realização de uma ação e se esquece de tratar das ações complementares para sua realização.
Mas, em um mundo cada vez mais totalizado, o vigor da conexão online reposiciona poderes. Estima-se que bilhões de pessoas e instituições estejam interligados via web. Estamos vivendo conectados em um ciberespaço que nada tem a ver com as condições da realidade fundeada que habitamos presencialmente com sua perspectiva de percepção
O ciberespaço tem novo contorno permitindo representar de modo estético a diversidade de emoções e sentimentos que ele suscita no homem. É uma perspectiva livre de qualquer referência anterior carregada de profunda vivência pessoal podendo suscitar em outros um desejo de prolongamento ou renovação continua.
O linguagear [1] dos conectados nesta realidade não é padronizado, pois é uma coordenação de condutas e opera em comunidades de convivencia. Estas trocas de enunciados induzem para uma possível finalização, com afetividade organizacional, mais que atendem a um poder central. Assim os poderes se reposicionam na nova conduta dos receptores ao receber os discursos tradicionais.
Esta enunciação em conexão é um dialogo social livre e em réplica, um discurso interior que se exterioriza no espaço cibernético, mas que não existe fora de um contexto de troca entre seres humanos. A nova perspectiva mudará todos os discursos e suas formas de poder. O estranhamento e a individualidade dos discursos em convivência mostra a diferença e não o consenso. A sensação da percepção dos significados não é universal em sua condição e marca a destruição do discurso tradicional pela situação instável de um linguageamento que coincide com um o estado emotivo do pensamento e que, ainda, procura as palavras certas para finalizar o que quer dizer. [2]
Aldo de A Barreto
[1] “Como seres humanos, vivemos imersos em um fluir incessante de ações que Humberto Maturana chama de “linguagear”. A linguagem é usualmente entendida como a transmissão de informação simbólica. Mas, em seu trabalho, Maturana deixa o conceito de informação completamente de fora; diz que os símbolos são secundários ao ato de linguagear que é uma coordenação de condutas. Então, o linguagear é um modo de viver caracteristicamente humano, no qual somos imersos.” Em Vaz, M.N. – O Linguagear é o modo de vida nos trabalhos humanos, Revista Ciência e Cultura da SBPC, número 60, especial 1, julho de 2008.
[2] Lyotard, Jean-François. The Differend: Phrases in Dispute. Minneapolis: University of Minnesota , USA 1988.